Por Brad Haynes - br.reuters.com
O crescimento no mercado de veículos do
Brasil entrou em ponto morto, mas é tarde demais para as montadoras
pisarem no freio. Ao mesmo tempo que as vendas domésticas recuam e as
exportações despencam, o setor está acrescentando mais de 1 milhão de
veículos em nova capacidade em apenas alguns anos, o que deve impactar a
lucratividade no quarto maior mercado automotivo do mundo.
Até 2017, as montadoras instaladas no país terão capacidade
para montar 6 milhões de veículos ao ano no Brasil, apesar das vendas
locais poderem enfrentar dificuldades para ultrapassar a marca de 4
milhões de unidades, dizem analistas, que culpam uma política industrial
de ajuda exagerada ao setor e euforia demasiada com mercados
emergentes.
"Todos entraram na onda", disse o analista Guido Vildozo, da
IHS Automotive, citando ambições exageradas no Brasil depois que as
vendas cresceram 10 por cento em média na década passada. As montadoras
agora estão investindo cerca de 5 bilhões de dólares por ano em linhas
de montagem locais justo quando o mercado começa a diminuir.
Os lucros foram a primeira vítima do aperto futuro e as
relações trabalhistas podem ser a próxima, com o espectro de demissões
chegando mais próximo em um ano de eleição presidencial. Uma corrida
para os mercados de exportação ressalta também o abismo competitivo que
separa as indústrias no Brasil e no rival regional, o México.
As fábricas mexicanas têm custos trabalhistas menores, acesso
fácil a fornecedores dos Estados Unidos e 43 acordos de livre comércio,
segundo Vildozo da IHS.
O Brasil tem apenas seis acordos bilaterais cobrindo o comércio
de automóveis, incluindo quatro com vizinhos imediatos e a África do
Sul. O comércio bilateral com o México vem sofrendo desde 2012, quando o
Brasil impôs cotas bilaterais para interromper uma torrente de
importações mexicanas.
"Será um processo doloroso, especialmente a negociação com os
sindicatos, mas não esperamos que alguém feche as portas", disse
Vildozo.
Há muito foco da política industrial brasileira, as montadoras
de veículos estão em uma situação difícil precisamente por causa das
proteções com que contam.
A presidente Dilma Rousseff e os antecessores mantiveram as
vendas de automóveis avançando com isenções de impostos, crédito barato e
barreiras à importação, o que encorajou um conjunto de fábricas de
automóveis não competitivas.
O resultado é uma indústria lotada e ineficiente presa ao seu
mercado doméstico, com poucas opções de exportação exceto a vizinha
Argentina, que vive uma crise cambial.
As vendas e a produção no Brasil dobraram desde 2005 para cerca
de 3,8 milhões de veículos no ano passado, no entanto, as exportações
despencaram 40 por cento para cerca de meio milhão de carros, caminhões e
ônibus.
Quando a situação estava boa, as montadoras aproveitaram largas
margens de lucro sobre plataformas desatualizadas como a Kombi, da
Volkswagen, um modelo de 56 anos que só saiu de produção no ano passado.
Mas a festa acabou para as maiores marcas no país, depois de anos na
dependência de dinheiro de unidades locais para compensarem um fraco
crescimento global.
Fiat, Volkswagen, General Motors e Ford viram os lucros
despencarem em suas unidades brasileiras no último trimestre devido a
uma queda na participação no mercado, custos maiores e uma moeda mais
fraca.
Preocupações se espalharam pela indústria no final de 2013 por
causa das crescentes fileiras de carros novos parados nos pátios das
fábricas. Analistas relataram que concessionárias estavam oferecendo
descontos de até 35 por cento para reduzirem o estoque de modelos
ultrapassados.
O mercado brasileiro pode estar na metade de uma queda de três
anos, segundo Stephan Keese da consultoria automotiva Roland Berger no
Brasil. Ele alertou que o excesso de novas fábricas em uma economia
fraca podem levar a um excesso de capacidade de mais de 30 por cento nos
próximos anos, cerca do dobro do excesso de capacidade normal da
indústria.
Previsões róseas geradas nos anos de crescimento forte têm
apenas parte da culpa, ele acrescentou, já que as políticas do governo
forçaram muitas marcas a construir fábricas locais para evitar altos
impostos sobre conteúdo importado.
"O excesso de capacidade foi previsível pois não foi apoiado no
mercado. Ele se deu em grande parte pela intervenção do governo", disse
Keese.
A indústria afirma que emprega mais de 150 mil pessoas e é
responsável por mais de um quinto da produção industrial do país. As
montadoras anunciaram investimentos de cerca de 35 bilhões de dólares
entre 2012 e 2018, ajudando a elevar a fraca taxa de investimento da
economia.
Mas mesmo a associação de montadoras, Anfavea, reconhece que as
vendas no Brasil não absorverão mais de três quartos da capacidade
produtiva nacional em 2017, quando as fábricas poderão produzir até 6
milhões de veículos por ano.
"É um bom problema para se ter", disse Luiz Moan, presidente da
Anfavea e alto executivo da GM, a jornalistas nesta semana. "Sabemos
que precisamos ganhar competitividade para poderemos exportar pelo menos
1 milhão d e veículos em 2017."
Para cumprir esta meta, a indústria terá que dobrar suas
exportações em quatro anos, colocando o setor contra sua contraparte
mais competitiva no México.
"Do ponto de vista das exportações, todos os ovos do Brasil
estão em uma única cesta: a Argentina", disse Vildozo, da IHS. "E essa
cesta rachou."
A Argentina promoveu uma série de medidas para restringir
importações e as exportações brasileiras começaram o ano com queda de 24
por cento. Até recentemente, o país recebia até 9 de cada 10 carros
exportados pelo Brasil.
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