quinta-feira, 23 de maio de 2013

Wikibrands: o dia em que a Ferrero se lambuzou com Nutella


A Ferrero, fabricante de guloseimas como a famosa Nutella, tem uma vantagem interessante sobre seus concorrentes: seus clientes idolatram o produto. Desde 2007, a norte-americana Sara Rosso mantinha o site World Nutella Day, destinado a reunir os fãs do doce à base de creme de avelã, compartilhar histórias, receitas e - como o nome sugere - fazer uma comemoração anual, de forma completamente gratuita. Sim, publicidade e relacionamento com os consumidores com qualidade e de graça!
Mas ela foi surpreendida quando a Ferrero enviou uma carta de cessação de prática (cease and desist) no dia 16 de maio, acusando Sara de se apossar da marca sem autorização da companhia. Em linhas gerais, ela teria de tirar o site e as páginas de redes sociais do ar, se não quisesse enfrentar um processo jurídico. Segundo ela, as relações com o time de estratégia de marca e relações públicas da companhia sempre foram amistosas, o que indica que a iniciativa veio do departamento jurídico - que demonstrou não entender chongas de marketing e estratégia, muito menos de comunicação interna.
Aparentemente, todo o problema começou por conta de um "procedimento de rotina em defesa da marca registrada, ativado como resultado do uso impróprio da marca Nutella na fanpage".
A fanpage World Nutella Day tem, atualmente, mais de 40 mil fãs. O website poderia ser um case único de storytelling e construção colaborativa da marca, duas das tendências mais cobiçadas pelas empresas atualmente. As equipes de marketing e jurídica da Ferrero, após finalmente se entenderem, resolveram liberar o World Nutella Day e reconquistar as boas relações com Sara Rosso, conforme comunicado publicado no próprio site.
"A Ferrero tem o prazer de anunciar que hoje, após contatar Sara Rosso e encontrar junto a ela as soluções apropriadas, suspendeu imediatamente a ação anterior. A Ferrero se considera afortunada em ter fãs tão devotos e leais […]"

Wikibrands

No ano passado, o Administradores.com entrevistou Mike Dover, um dos autores do livro "Wikibrands: Como reinventar sua empresa em um mercado orientado para os clientes". A ideia já vem expressa no próprio termo: as marcas não são mais de propriedade exclusiva da empresa. Sua disseminação não depende de estratégias calcárias orientadas para a mídia de massa. A participação dos consumidores está se tornando fundamental para esse processo de construção, e poucos negócios estão acertando a mão nessa receita. Para Dover:
"Não seria exagero de forma alguma [dizer que as organizações perderam o monopólio sobre suas marcas]. Os dias de a empresa decidir o que a marca é e como ela vai divulgar sua imagem e suas mensagens já acabaram. Hoje, quem define uma marca é seu consumidor".
A Ferrero tinha todos os ingredientes na mão, e um chef de primeira para preparar a receita de boa vontade. Tudo o que precisava fazer era nada. E optou por interferir da pior maneira possível, de modo a causar os piores resultados para ela mesma, conforme apregoa a Lei de Murphy. Lembra Dover:
"[As empresas] que souberem melhor como extrair valor de tudo que se está sendo falado sobre a marca, vão ganhar uma vantagem competitiva muito grande".
Abrindo mão dessa vantagem competitiva, a Ferrero arriscou perder um ativo extremamente raro e valioso.
"A verdade é que os consumidores nem sempre querem ter um relacionamento muito profundo com todas as marcas com que fazem negócios […] Para algumas marcas, a relação de proximidade com o cliente é um desafio muito mais difícil do que para outras".
Difícil é imaginar o que o departamento jurídico da Ferrero esperava conquistar ao proibir o uso colaborativo de sua marca. Seria compreensível se alguém estivesse ganhando muito dinheiro se apropriando da marca Nutella, o que não era o caso. Definitivamente, a companhia lambuzou a própria gravata com a pasta de avelã Nutella®.

www.administradores.com.br

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